segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

O DIA DO IMPERADOR - por Laurentino Gomes



Vamos falar do nosso imperador  D.PEDRO I.
Quem descreve é o historiador supra citado, na sua obra

"1822 : como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram D.Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado."
Rio de Janeiro : Nova  Fronteira, 2010.






Hiperativo, acordava às seis horas da manhã e ia dormir só depois das 11 da noite.
Devoto de Nossa Senhora, galopava de manhã de São Cristóvão à igreja da Glória só para ouvir missa.


De volta ao palácio almoçava às 9h e jantava às 14h.
Gastava menos de vinte minutos em cada refeição.
Tinha o apetite voraz, mas hábitos gastronômicos simplórios.
A inglesa  MARIA GRAHAM  conta que o prato preferido dele era 
'"um pedaço gorduroso de carne de porco ou de boi com arroz, batata e abóbora cozida  -  tudo misturado no mesmo prato.'A carne era  'tão dura que poucas facas conseguiriam cortá-la.'"

 


Como detestava delegar poderes aos ministros e auxiliares, fazia quase tudo sozinho :
inspecionava os navios no porto,
visitava as fortalezas,
percorria as repartições públicas para conferir se os funcionários trabalhavam direito,
ia ao teatro ver os preparativos para os espetáculos,
supervisionava as cavalariças do palácio
e se imiscuía em questões pequenas diante da importância do cargo que ocupava.


 
Numa ocasião, chegou de surpresa às lojas do centro do Rio de Janeiro, depois de receber a denúncia de que os comerciantes fraudavam medidas para enganar os clientes na venda de tecidos e outras mercadorias.
Munido da medida padrão do império, foi de loja em loja mensurando as réguas métricas e tomando nota dos infratores, que seriam punidos mais tarde.


 
Às sextas-feiras, dava audiências públicas nas quais ouvia queixas, pedidos e sugestões de qualquer pessoa que se dispusesse a entrar na fila.
Resolvia tudo ali mesmo ou, quando não fosse possível, dava três dias de prazo para que os ministros encontrassem uma solução.


 
Apesar da agenda lotada, ainda tinha tempo para dar suas famosas escapadas amorosas, que muitas vezes invadiam as madrugadas.



Cioso de sua autoridade, iniciava suas cartas sempre com o pronome possessivo na primeira pessoa :
'meu conde',
'meu Barbacena',
'meu Queluz',
'meu pai',
'meu Senhor',
'meu Filho'.




Tinha prazer em mandar e abominava ser desafiado.

"Ao contrário do pai, cujo horror a tomar decisões levava-o a adiá-las e contorná-las  o mais possível, possuía o gosto, a volúpia do mando"
 afirmou OCTÁVIO TARQUINIO DE SOUSA, seu biógrafo.

"Nascera para ser chefe, para governar, para ser obedecido".




No tratamento com os ministros era sempre autoritário e inquisitivo, usando expressões como
'eu lhe ordeno' ou
'execute literalmente'.



Numa carta a JOÃO SEVERIANO MACIEL DA COSTA, ministro do Império e futuro marquês de Queluz, deu um conselho tipicamente brasileiro :
'Não preciso recomendar-lhe que faça muito espalhafato, indo aos arsenais, alfândegas, etc., etc. ; já governou e sabe muito bem como se engana o povo'.




Mesmo nascido numa família real, mantinha negócios paralelos, alguns até mesquinhos, que não combinavam com as altas responsabilidades da função de imperador.


Na juventude, D.JOÃO VI o repreendeu ao descobrir que comprava cavalos comuns no Rio de Janeiro, marcava-os com o selo da Fazenda Real de Santa Cruz e os revendia por um preço muito maior para pessoas que queriam ostentar proximidade com a corte.
O intermediário nas negociações era o barbeiro do palácio da Quinta da Boa Vista, PLÁCIDO PEREIRA DE ABREU, com quem o príncipe repartia os lucros..



ROBERT WALSH  relatou que D.Pedro se dedicava a várias outras atividades lucrativas :
fabricava cachaça, comercializada nos botequins cariocas ;
arrendava os pastos da Fazenda Real para descanso do gado que descia de Minas Gerais para o Rio de Janeiro ;
e seus escravos cortavam o capim da fazenda  e vendiam nas ruas da cidade.



Era impaciente com as regras e as restrições do cerimonial da corte. 
Nesse aspecto assemelhava-se à mãe, a geniosa espanhola CARLOTA JOAQUINA, também conhecida pela destreza com os cavalos e pelas aventuras sexuais..
Como a mãe, adorava cavalgar e disputar corridas de carruagens, em disparada e açoitando os animais com chicotes.

O cronista LUIZ LAMEGO diz que teria sofrido ao todo 36 quedas a cavalo.  Numa delas, em 1829, quebrou sete costelas.

Certa vez um de seus animais perdeu a ferradura enquanto cavalgava nos arredores do Rio. 
D.PEDRO  bateu à porta de um ferreiro e lhe deu ordens para ferrar a montaria. 
Ao perceber que o homem não dominava bem o ofício, tomou-lhe as ferramentas  e ordenou :
'Sai daí, porcalhão, que não sabes o teu ofício'.
Em poucos minutos fez o serviço sozinho.


"D.PEDRO sabia melhor que os moços das cavalariças tratar, dar banhos, sangrar e ferrar cavalos e muito se vangloriava disso",
afirmou CARLOS OBERAKER JR., biógrafo da imperatriz LEOPOLDINA. 
"Vivia a maior parte do dia em companhia dos lacaios e criados, ou dos filhos destes, adotando sua gíria grosseira  e obscena, salpicando a conversa de expressões que um homem bem-educado não pronunciaria."




Gostava de jogar, mas era mal perdedor.
O viajante francês  JACQUES ARAGO contou ter sido convidado pelo imperador para uma partida de bilhar quando estava no Rio de Janeiro.
Conhecedora do cráter impulsivo do marido, a imperatriz LEOPOLDINA aproximou-se do francês antes que o jogo começasse e cochiclou-lhe ao ouvido :
"Deixe-o ganhar algumas partidas, meu marido é bastante colérico".
ARAGO, que era um excelente jogador, não lhe deu atenção e, em vez disso, ganhou todas as partidas.
D.PEDRO reagiu de forma inesperada produzindo  "uma cena digna de pessoas perversas em uma das piores tavernas de arrabaldes", segundo o relato do viajante.
Em seguida tentou blefar mas, como continuasse a perder, abandonou o jogo irritadíssimo.




"De natureza impulsiva, voluntariosa e volúvel, era sujeito a súbitas alterações de humor e a violentas e repetidas explosões que tornavam difícil o seu convívio",
apontou a historiadora cearense ISABEL LUSTOSA.
"Eram logo sucedidas por atitudes de franca conciliação, quando dava demonstrações exageradas de arrependimento a quem antes ofendera".




O espírito indomável seria abatido apenas pelos ataques de epilepsia, doença caracterizada por violenta descarga elétrica no cérebro que, dependendo da área atingida, faz o paciente perder os sentidos e se debater em convulsões.
D.PEDRO teve pelo menos seis até os 18 anos.

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Na carola corte portuguesa, a instrução básica de D.PEDRO foi confiada a cinco padres.
JOSÉ MONTEIRO DA ROCHA, jesuíta, ministrou-lhe as primeiras letras, entre os 6 e 9 anos.
Com o franciscano ANTONIO DE ARRÁBIDA aprendeu latim.
O cônego RENATO BOIRET  ensinou-lhe francês.
Estudou inglês com PAULO TILBURY, capelão da Guarda Imperial, e JOÃO JOYCE, padre irlandês.
Nas artes, teve como professor de pintura e desenho  DOMINGOS ANTÔNIO DE SIQUEIRA.
Na música, sua educação foi bem mais esmerada, incluindo professores como os maestros e compositores  MARCOS ANTONIO PORTUGAL,  JOSÉ MAURÍCIO NUNES GARCIA  e  SIGISMUND NEUKOMM.


Como resultado, a obra musical de  D.PEDRO  ainda hoje surpreende os especialistas, com destaque para os acordes que compôs para o  Hino da Independência.

Anos mais tarde, depois de abdicar o trono brasileiro, em 1831, tornou-se amigo em Paris do compositor  ROSSINI, que se dizia encantado com os conhecimentos musicais de D.PEDRO.


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Sua vida provada foi intensa e tumultuada.
Embora não bebesse, gostava de farras, noitadas, amigos de má reputação e, em especial, das mulheres.   [  ]

Seu grande parceiro nas aventuras, públicas e provadas, foi o português  FRANCISCO GOMES DA SILVA, o  "Chalaça", um dos personagens mais memoráveis da história brasileira.


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"Chalaça" era dono de várias casas noturnas no centro da cidade, frequentadas por prostitutas, vagabundos e marinheiros. 
E nessa condição se tornou o alcoviteiro do príncipe nas suas escapadas sexuais.





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as peculiaridades do I Reinado :

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