NOVA REPÚBLICA
é a denominação atribuída pelos historiadores, ao período que se inicia em 1985, com a posse de um presidente civil após os 21 anos de Ditadura Militar no Brasil.
Esse período transcorre-se até hoje ...
1985 -
Presidência de JOSÉ SARNEY - MA
[ JOSÉ RIBAMAR FERREIRA DE ARAÚJO COSTA ]
JOSÉ SARNEY - Vice-Presidente da chapa com TANCREDO NEVES |
Na cerimônia de posse, SARNEY assume a Vice-Presidência.
TANCREDO NEVES não pôde comparecer para assinar o compromisso, pois encontrava-se internado [ao todo 39 dias] com infecção hospitalar : transferido do Hospital de Base de Brasília para o Instituto do Coração, em São Paulo, submetido a 7 cirurgias (diverticulite e infecção generalizada) , acaba falecendo no dia 21 de abril de 1985, comovendo a nação inteira.
TANCREDO NEVES - Presidente eleito. |
SARNEY é efetivado no cargo de Presidente da República sob grande expectativa e em meio a várias dúvidas sobre a manutenção das forças políticas que apoiavam a 'dupla' ao Planalto , a execução do plano político e conciliador pregado pelo ex-presidente eleito
e a transição democrática do país.
Herda e mantém o Ministério composto por TANCREDO ; escolhe seu sobrinho FRANCISCO DORNELLES, ex-Secretário da Receita Federal de FIGUEIREDO, para o Ministério da Fazenda.
Logo começam as divergências quanto às propostas de combate à inflação e do endividamento.
O Congresso aprova um projeto do governo conhecido como
"Emendão" :
* término das intervenções sindicais.
* eleições diretas para prefeitos das capitais, estâncias hidrominerais e 'áreas de segurança nacional'.
* eleições diretas para a Presidência da República.
* direito de voto aos analfabetos.
* pluripartidarismo / livre organização partidária.
* convocação de Assembléia Constituinte para 86.
Entretanto, o governo convoca um Congresso Constituinte e entrega a uma comissão de notáveis, presidida pelo jurista AFONSO ARINOS DE MELLO FRANCO a tarefa de elaborar um anteprojeto constitucional, a ser discutido pelos constituintes eleitos em 15 de novembro de 86.
Os novos partidos políticos são :
PDS / PDT / PT / PTB / PPB / PDC / PMC / PH / PSC / PL / PCB / PCdoB / PFL / PMB / PCN / PND / PSB.
Nas eleições às Prefeituras (15/11/85) o PMDB avantaja-se em MG , PR , RS e PB ;
em São Paulo vence JÂNIO QUADROS (PTB-PFL),
no Rio de Janeiro, LEONEL BRIZOLA (PDT) e
em Fortaleza MARIA LUIZA FONTENELLE (PT).
Em seguida ocorrem mudanças ministeriais :
DILSON FUNARO recebe o Ministério da Fazenda e
JOÃO SAYAD o Ministério do Planejamento.
A situação econômica é grave e quase incontrolável :
greves e passeatas por reposição salarial,
acampamentos de desempregados,
concentrações,
inflação galopante,
o problema dos 'sem terra' (= desempregados e subempregados que clamam por Justiça).
Em sigilo o governo prepara o
"Plano de Estabilização Econômica" (= Plano Cruzado)
e o lança ao país na manhã de 26 de fevereiro de 1986 - o governo passa a intervir diretamente na economia, estabelecendo :
* desvalorização da moeda em 3 algarismos e substituição do 'cruzeiro' (Cr$) pelo 'cruzado' (Cz$) ;
* congelamento de preços por 1 ano ;
* congelamento dos salários e abono de 8% a todas as categorias como forma de reposição salarial ;
* transferência de inúmeras estatais para o setor privado ;
* corte de 20 % nos investimentos do governo ;
* prioridade de investimentos para as áreas sociais.
BRIZOLA contesta, mas a população do país transforma-se em "fiscais do Sarney", controlando preços congelados e denunciando à SUNAB os comerciantes desatenciosos ou mal intencionados às determinações.
O consumo dos artigos essenciais aumenta e desaparecem das prateleiras, numa estratégia dos empresários : retiram os produtos com preços defasados e os relançam 'maquilados' com novas embalagens e preços.
Depois do leite e da carne começam a faltar artigos para construção, carros, equipamentos e bebidas.
Introduz-se a cobrança de 'ágio' sobre o preço das mercadorias mais difíceis.
E a fila torna-se uma instituição nacional.
Nenhum sonegador é preso, nem uma indústria fechada por fraudar o congelamento e maquilar produtos.
Prendem-se gerentes e subalternos ; deixam à solta seus patrões.
O governo perde credibilidade e em julho de 86 institui o
"Plano de Metas" 86-89
para 'refrear o consumo, garantir recursos para os investimentos oficiais e o financiamento do setor privado' - nesse plano está o empréstimo compulsório sobre o álcool e a gasolina, sobre os carros novos, sobre carros usados com menos de 4 anos, taxa sobre compra de dólar e 25% sobre compra de passagens para o exterior.
O governo não toca em problemas 'estruturais' como a reforma agrária e cujas resistências se organizam na UDR - União Democrática Ruralista (= os latifundiários, contra a Reforma).
No plano externo, reata relações com Cuba e reafirma soberania nacional face às pressões norte-americanas e francesas pelo mercado da informática brasileira.
Estabelece a 'moratória técnica' para os juros da dívida externa - o Ministro FUNARO declara numa reunião do FMI que o Brasil paga o total da dívida externa a cada 7 anos...
DILSON FUNARO
entrevista de 23/08/1988
Assinatura do PICE - Programa de Integração e Cooperação Econômica e o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento com a Argentina.
Em 16 de março de 1987
tomam posse os 22 governadores eleitos pelo PMDB, no pleito de 15 de novembro, sob o auge da popularidade do 'cruzado' :
MOREIRA FRANCO (RJ),
ORESTES QUÉRCIA (SP),
NELSON CARDOSO (MG)...
que exigem nova diretriz econômica e a queda de FUNARO.
Presidido por ULYSSES GUIMARÃES, "eminência parda' do governo, o PMDB rebela-se e veta a indicação do governador TASSO JEREISSATI (CE) para o Ministério da Fazenda.
As articulações de QUÉRCIA elevam o Prof. LUIS CARLOS BRESSER PEREIRA àquela Pasta.
Em 18 de maio de 87, SARNEY discursa à nação anunciando que decidira permanecer no cargo até 1990, fixando o seu mandato em 5 anos : o "Fico II" - e começa a soltar verbas para os Estados em troca de apoio político e privilégios a parlamentares por meio das concessões de emissoras de rádio e TV.
Em 12 de junho, anuncia o
"Plano Bresser" :
congelamento de preços, salários e aluguéis por 90 dias, eliminação do 'gatilho salarial' e criação da URP (Unidade Referência de Preços) como índice de reajustamento de preços e salários.
E o povo começa a conjugar o verbo do futuro do Brasil : "eu empoBRESSERei, tu empoBRESSERás..."
Um grupo de 'peemedebistas históricos', como
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO,
FRANCO MONTORO,
MÁRIO COVAS,
JOSÉ SERRA e
PIMENTA DA VEIGA,
funda o PSDB - Partido Social Democrático Brasileiro
e no mesmo ano é promulgada a
"Constituição - 88" , caracterizada por :
* democracia liberal ;
* separação dos 3 Poderes ;
* eleição direta par todos os cargos do Executivo e Legislativo ;
* eleição com 2 turnos para Presidente, Governadores e Prefeituras com mais de 200.000 habitantes ;
* mandato presidencial de 5 anos ;
* voto obrigatório entre os 18 e 70 anos ;
* voto facultativo a analfabetos e jovens entre 16-18 anos e com mais de 70 anos ;
* fim da censura prévia ;
* direito de greve ;
* liberdade sindical ;
* posse da terra aos índios ;
* desapropriação com indenização das propriedades rurais sem função social ;
* racismo torna-se crime ;
* direitos trabalhistas aos rurais e às domésticas ;
* jornada de 44 horas ;
* hora extra com 50% a mais do valor da hora normal trabalhada ;
* nacionalismo econômico ;
* intervenção do Estado na economia ;
* amplo assistencialismo social e direitos trabalhistas ;
* descentralização administrativa e financeira ;
* realização de plebiscito sobre regime, forma e sistema de governo para daí 5 anos.
No decorrer dos trabalhos da Constituinte, o Presidente da Câmara dos Deputados e da Constituinte, ULYSSES GUIMARÃES, proferiu estas preciosidades, registradas pela Imprensa :
" O Estado é meio, não o fim. O homem é o fim - antologia do Estado."
" Democracia é a vontade da lei, que é plural e igual para todos, e não a do príncipe que é impessoal e desigual para os favorecimentos e privilégios".
" A Constituição é caracteristicamente o estatuto do homem. (...) O inimigo mortal do homem é a miséria. Não há pior discriminação do que a miséria. O Estado de Direito, sectário da igualdade, não pode conviver com o estado de miséria."
" Num país de 30.401.000 habitantes analfabetos, afrontosos 25% da população, cabe advertir ; a cidadania começa com o alfabeto."
No ano de 1988 a inflação chega a quase 1.000 %.
1988
30/05 - Um ônibus invade o Palácio do Planalto.
30/05 - Um ônibus invade o Palácio do Planalto.
22/12 -Assassinato de CHICO MENDES.
31/12 -Tragédia com o 'Bateau Mouche' durante o réveillon no Rio de Janeiro
Em 15 de janeiro de 1989, o
"Plano Verão"
do novo Ministro MAILSON DA NÓBREGA :
- criação do 'Cruzado Novo' (NCz$) com corte de 3 zeros da moeda anterior, com manutenção do centavo ;
- extinção da OTN ;
- criação do BTN - Bônus do Tesouro Nacional ;
- aumento dos juros bancários ;
- contenção das despesas públicas ;
- privatização de estatais ...
Os salários mantêm-se congelados mas os preços são realinhados na véspera do anúncio do Plano : energia elétrica, água, correios, telefonia, combustíveis, remédios, alimentos...
Plano Verão
Inúmeros escândalos rondam o governo :
o da Ferrovia Norte-Sul,
o rombo da corretora BANESPA,
da Transbrasil,
da Sharp e Engesa,
sobre o BNDE ...
O candidato LULA, numa entrevista de programa de televisão.
ULYSSES GUIMARÃES, PAULO MALUF, MÁRIO COVAS e outros 15 candidatos politicamente inexpressivos concorrem com FERNANDO COLLOR DE MELLO que,
denunciando a corrupção,
apresentando-se como 'caçador de marajás',
representante dos 'descamisados' e
'salvador da Pátria',
jovem de estilo agressivo, apoiado por consideráveis setores conservadores e de um partido criado exclusivamente para ajudá-lo, acaba elegendo-se pela adesão das Organizações Globo e por seus 'slogans' sem projetos.
1º Turno - 15/11 : 21 candidatos / 30 partidos políticos.
Collor no 1º turno recebeu 28,52 % dos votos ;
Lula, 16,08 %.
2º Turno - 17/12 :
Collor obteve 42,75 % e
Lula, 37,86 %.
CONSTITUIÇÃO DE 88
MARLY RODRIGUES
in "A Década de 80".
S.Paulo : Ática, 1992
" A nova Constituição brasileira passou a vigorar em 5 de outubro de 1988.
Para que ela possa ser posta em prática, em toda sua plenitude, serão ainda necessárias 450 leis complementares.
Entre inúmeras outras importantes medidas, a Constituição restringe o poder das Forças Armadas à garantia dos poderes constitucionais.
As liberdades individuais também foram ampliadas, assim como as possibilidades de influência popular no Legislativo, por meio da 'iniciativa popular', isto é, da apresentação de projetos de lei assinados por 1% do eleitorado.
A ordem trabalhista também melhorou.
Houve diminuição do máximo de horas de trabalho semanal, o aumento da remuneração durante período de férias, ampliação da licença gestante e a criação da licença paternidade.
Se observarmos mais de perto o desenrolar dos trabalhos da Constituinte, verificaremos que a inclusão de pequenos avanços para as classes trabalhadoras sempre se fez sob intensa pressão da bancada de esquerda e no limite máximo da concessão dos políticos de centro e de direita.
Entre outras coisas, isto quer dizer que a Constituição tentou reformar tudo sem modificar nada, de modo a conservar sem arranhões profundos a ordem social já existente.
A importância de uma Constituição na qual foram incorporadas algumas liberdades, como a proibição da censura, e reconhecidos alguns direitos, como o de greve e de não-interferência do Estado nas organizações sindicais, é inegável.
Mas é indiscutível que sua existência não altera os desiquilíbrios sociais e nem garante que o nela instituído é direito de todos os brasileiros e muito menos que ela abarca as tensões próprias do confronto democrático entre as classes sociais.
Como nos lembra o jurista FÁBIO KONDER COMPARATO, embora a nova Constituição tenha ampliado os direitos e liberdades individuais, ela atribui a garantia de tais direitos ao Estado.
Do ponto de vista das classes trabalhadoras, essa vinculação reforça ainda mais a necessidade de uma prática social organizada, através da qual se amplie a pressão e o controle sobre o Estado.
Ao mesmo tempo, essa prática deve desenvolver-se de modo a criar um espaço independente de exercício da cidadania e a garantir que a "lei suprema da Nação" não seja apenas um instrumento a mais nas mãos dos segmentos sociais para os quais, no dizer de FLORESTAN FERNANDES, ela já é efetiva, uma vez que tais segmentos dispõem do arbítrio.
Às vésperas da promulgação da Constituição, alguma das resoluções já aprovadas começaram a ser desrespeitadas, e pelo próprio governo.
O presidente da República, invadindo atribuições agora específicas do Legislativo, reformulou ministérios e aprovou concessões de rádio e TV, além de assinar medidas irregulares, como a contratação de funcionários sem concurso público.
Outro exemplo de desrespeito e intolerância com a livre prática dos direitos sociais não faltam.
Talvez um dos mais gritantes tenha acontecido durante a greve dos metalúrgicos de Volta Redonda, em novembro de 1988, quando o governo, negando o direito de greve recém-garantido constitucionalmente, ordenou que o Exército invadisse as dependências da usina ocupada pelos grevistas que exigiam 26% de reposição salarial, implantação do turno de 6 horas de trabalho e a readmissão de 70 companheiros demitidos nas últimas greves da empresa.
Da violência do choque resultaram três operários mortos e 42 feridos.
O respeito aos direitos do cidadão não depende, portanto só das leis.
Ele é conquistado por uma postura individual reivindicatória e pela ação organizada das forças populares que possibilitem, entre outras coisas, a superação da mentalidade do "levar vantagem", expressa até nas pequenas atitudes do dia-a-dia, segundo a qual todo abuso do espaço alheio é legítimo. "
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